La Argentinidad no CINEMA

Friday, December 29, 2006

ENTREVISTA: CLAUDIO ESPAÑA
PARTE 2

Esta segunda parte da entrevista com o crítico de cinema, historiador e professor Claudio España está formatada por tópicos, compreendendo ser a melhor forma para entender a estrutura que o entrevistado buscou para aprofundar sua análise sobre o cinema argentino a partir da década de 60 até os anos 90.
Bom proveito.

CLÁUDIO ESPAÑA
- Dentro do que é modernidade e os grupos de vanguarda, te vou numerar estruturas para que veja como se transformam. Primeiro há um modelo com que o cinema mais antigo, que se filma todo a cores, e isto passa a caracterizar o cinema tradicional no mundo moderno, já que em grande medida, continua. No entanto, surge um novo cine argentino.

NUEVO CINE ARGENTINO E LEONARDO FAVIO
- Filmando em preto e branco, a partir de 1960, já se nota que há um tipo de cinema diferente, de filmes como “Los inundados”, de Fernando Birri; “Tres veces Ana”, de David José Kohon; “Los jóvenes viejos” de Rodolfo Kuhn, e tantas outros filmes que advertem que há uma nova geração de diretores que trás uma novidade muito importante ao cinema.
Esse grupo, que se chamou de Nuevo cine argentino, até 1965 se diluiu. Quando a geração se dilui, quando se começa a perder interesse, alguns diretores começam a se dedicar a um cinema mais industrial, mas sempre com o espírito de um diretor renovador. O que ocorre justo neste momento em que se desaparece esta geração, é que surge Leonardo Favio, como diretor. Favio trás um cinema novo, um cinema mais espiritual, emotivo, com muitas marcas de criatividade visual, com o qual se engancha com esta geração que estava terminando. Por outro lado, Favio indaga os problemas do público e o público começa a lhe dar importância. Todo este cinema de Favio vai dando alguma significação a um tipo de cinema que está concentrado a um diretor, com filmes como “Cronica de un niño solo”, “Éste es el romance del Aniceto y la Francisca…”.
A geração de 60 se havia formado com o curta metragem, porque a lei trouxe o fomento ao curta, pois como havia desaparecido a indústria, os estúdios de cinema, onde os diretores se formavam, havia que se formar uma escola de cinema, se fomentando então o curta metragem. Todos estes diretores que surgiram da geração de 60 passaram pela realização de curtas.


O SURGIMENTO DA TELEVISÃO E PUBLICIDADE
- A partir de 60, também começou a se desenvolver um novo tipo de indústria, na Argentina, em duas pontas: por um lado, a televisão, que em 1960 surgiam quatro canais de televisão, sendo que desde 1951 até 1960 só existia um. Com o aparecimento da televisão, começou a se exigir mais técnicos, mais artistas, mais filmes e também mais publicidade. A grande escola com novidades que aparece depois de 61/62 é através da publicidade, começando a aparecer novos diretores, que eram até então capazes de contar uma história em 45 segundos, e que então possuíam interesse em contar uma história em 90 minutos. A partir de 1968, depois da geração de 60 e de Leonardo Favio aparece uma terceira geração, que é a gente que vem da publicidade, simultâneamente ao cinema genérico, de músicos, de cantores populares. Há um par de diretores de publicidade que aparece dizendo que queriam fazer filmes, e isto toma três caminhos: Cine Liberación; Grupo de los 5; Cine de la Disgreción.


CINE LIBERACIÓN
- Em 1968 estamos em uma ditadura na Argentina e a reação no campo do cinema traz a novidade do cinema militante. Se começa a exibir fragmentos dos filmes nos clubes, nos sindicatos, nas universidades, nas fábricas, sendo que se exibe de forma clandestina o filme “La hora de los hornos”, feito por Fernando “Pino” Solanas e Octavio Getino. Filme que se baseava sobre o tema do colonialismo, a partir do livro “Condenados de la tierra”, de Frantz Fanon, “La hora de los hornos”, era um filme que não se podia ver, só podendo entrar em cartaz em 1973, cinco anos depois de sua realização. Houve até situações em que a polícia sequestrava pessoas que viam este filme. Este grupo se chamou de Cine Liberación e sua consignia era criar o que se chamava um terceiro cinema, o cinema próprio do terceiro mundo. Por que terceiro cinema? Porque havia um primeiro cinema popular, cinema de gêneros e industrial, um segundo cinema que chamavam de burguês e mentiroso, que foi da geração de 60, pois contava sobre a tristeza dos jovens que não tinham nada que fazer. Em 68 aparece Solanas, que vinha da publicidade, aprendeu a fazer cinema em um agência de publicidade que tinha com seu irmão, a Solanas Publicidad, que era uma agência de publicidade de televisão muito importante. Com o surgimento da ditadura em 1976, Solanas teve que se exilar.


GRUPO DE LOS 5
- Em 1968 também aparece um outro grupo de cinco diretores que também haviam se formado com a publicidade e televisão, mas que não decidiram fazer cinema politico ou militante, sim um outro tipo, mais perto do que eles queriam, ao delirio próprio, ao montar a publicidade em um longa metragem. Este grupo se chamou o Grupo dos 5, formado por Alberto Fischerman, Raúl de la Torre, Juan José Stagnaro, Néstor Paternostro e Ricardo Becher. Durante muitos anos este grupo esteve ignorado, sendo ressuscitado por um trabalho de conclusão de um aluno meu, chamado Diego Dubcovsky, que hoje é produtor. O Grupo dos 5 fez filmes “descabelados”, bonitos, experimentais e com muita auto-referência e tanto é assim, que um filme de Fischerman chamado “The Players vs. Ángeles caídos”, analisa a problemática do cinema, onde há um grupo que se chama The Players que entra a um estúdio de cinema a destruir-lo e o grupo de Los Angeles caídos são os protetores do cinema. Quando alguém vê o filme muito tempo depois, descobre que é o novo cinema que vem a expulsar o velho cinema, o cinema moderno que vêm atacar ao cinema clássico. Por outro lado em este filme há uma cena que é em um baile e há um cartaz que indica que a cena seguinte se chama “El baile de los espiritos”, com o qual é um dos únicos resquícios que ficaram claros que o Grupo dos 5 existiu, porque eles sempre negavam, sendo que aparecem os cinco filmando cada um em uma câmera a mesma cena, surgindo aí o elemento de auto referêncialidade.
Ricardo Becher também realiza um filme muito experimental, chamado “Tiro de gracia” onde há muitos assassinatos, na rua ou em diferentes lugares e não se sabe nunca quem os comete, sempre vistas dentro de um carro. Este filme de Ricardo também está muito associada com o que aqui se chamou o Instituto Torcuato di Tella, que foi um instituto de arte muito experimental, muito pop, localizado na calle Florida 900, que exercitava todos os delirios da arte que poderia se imaginar. Os personagens trabalham nas ruas, nos cafés, onde o verdadeiro garçom de um restaurante se torna ator no filme, num mescal de realismo com neo-realismo e surrealismo.
Paternostro fez um único filme, naquela época, chamada “Mosaico”, que narra a vida de modelos, que começavam a ser figuras muito importantes na cultura popular argentina. Stagnaro não filmou nenhum filme nesta época e Raúl de la Torre traz como novidade um filme chamado “Juan Lamaglia y Sra.”, quando a filma em um povoado onde havia nascido, buscando improvisar com os atores as cenas, no qual um diretor de teatro tomava nota do que diziam em um gravador e a partir daí se armou o filme. Quando alguém vê o filme, não se dá conta disto.


CINE DE LA DISGRESIÓN
- O outro grupo que surge a partir de 68 é chamado de Cine de la Disgreción, onde se muda de tema, é um tipo de cinema que não busca uma coerência, que prefere uma aproximação ao público, muito variado, moderno, começando a trabalhar com filmes a cores. Em geral são filmes mais independentes, mas já com um critério mais industrial e é daí que o cinema argentino vai encontrar um ponto de apoio para continuar. O primeiro ponto deste cinema surge com o filme “Tute Cabrero”, de Juan José Jusid, que significa um jogo de naipes, de cartas. O filme é sobre uma empresa no qual o patrão decide expulsar um dos funcionários e não se sabe a qual, onde começa então uma busca entre todos eles, entrando em questões como a hostilidade, tendo inclusive a ver com um grupo de teatro que surgiu na época chamado Teatro de la Crueldad. Este tipo de cinema é o que vai dar lugar a filmes como “La Patagonia rebelde”, “La tregua”, a filmes que dentro dos anos 70 vão se desenvolver em um movimento, onde também aparece Leonardo Favio com “Juan Moreira”, “Nazareno Cruz y el Lobo” e “Soñar, soñar”, intitulada de trilogia das cores.
Depois ocorrem as eleições em 1973, tendo um governo peronista novamente, com tendência de esquerda e um novo pulso tomava o cinema argentino. Em 1974 é como o florescimento do “cine de la disgreción”. Mas com o reaparecimento do regime militar em 1976 surge um cinema dirigido, produzido pelas Forças Armadas, com censura em quantidade, que dura até 1983.


O CINEMA NA DEMOCRACIA
- O período da democracia não tem uma classificação particular e interna. No entanto é um cinema muito êxitoso perante o público, onde praticamente em todos os filmes há uma referência ao processo militar, a ditadura, como também há filmes que enfocam fatos da realidade. Todo esse período que correm pelo lado muito humano, com problemáticas muito próximas a necessidades da gente, mas ao mesmo tempo narra fatos que são comprometidos social e politicamente, o que, de certa forma, cria uma unidade neste período. Cerca de 1995 começa a aparecer um tipo de cinema que vai perdendo o compromisso, mas que vai mantendo o interesse do espectador, com filmes policiais. Aparece um diretor notável neste período que é Jorge Polaco, que não toca temáticas políticas, mas que fala da solidão no meio da sociedade, realizando filmes muito densos, em busca de uma forma muito profunda de chegar a alma do personagem.


A NOVA GERAÇÃO DO CINEMA ARGENTINO
- De 95 a 99 há uma espécie de planície, um cinema que se repete, que é igual, onde não aparecem muitos filmes de interesse, até que em 1997 se descobre o filme “Pizza, birra, faso”, realizada por diretores jovens (Adrián Caetano e Bruno Stagnaro), onde com uma forma bastante interessante, acessível, são capazes de narrar fatos da sociedade argentina em seus aspectos mais sujos, como o roubo, a destruição, a vida obscura e que ao mesmo vai narrando a aparição de um tipo de família diferente, onde não há nem pai nem mãe, onde não há filhos, onde todos vivem juntos com uma garota que é noiva de outro, se delatando uma sociedade argentina que havia deixado o conceito velho de família. Isso aparece enormemente nesta nova geração. “Pizza, birra, faso” é a marca onde se termina este cinema da democracia, que se caiu na rotina durante o menemismo, denotando a existência de uma nova geração, formada também pelo curta metragem, nas escolas de cinema, que é a grande novidade desde os anos 90 até aqui. Junto com “Pizza, birra, faso”, “História breves” (série de dez curtas realizados por nomes como Lucrecia Martel, Daniel Burman, Adrián Caetano, Rodrigo Moreno e outros) são o elemento de novidade que estabelece a aparição de uma geração muito jovem, com teoria dentro do seu conhecimento, pela primeira vez no cinema argentino. Os diretores são capazes de produzir circunstâncias narrativas que a crítica não é capaz de destacá-las. O público perdeu a possibilidade de compreender a insistência do seu cinema novo com matizes diferentes, que possuem uma postura cinematográfica mais importante. O que não se aprendeu no entanto, entre estes jovens, é a enfocar essa costura cinematográfica sob a problemática do espectador, sobre o que passa na Argentina. Por exemplo, a perda de trabalho de milhões de pessoas na época do menemismo, que foi uma circunstância dolorosissima, não está tratado nos filmes, e quando o está, é tratada lateralmente quando isso deveria ser um tema central.


COMO É A RELAÇÃO ENTRE O PÚBLICO E O CINEMA ARGENTINO AO LONGO DESTES PERÍODOS?
- O primeiro período, do cinema industrial e clássico foi um público popular, do tango, das corridas, eram os que iam ao cinema escutar cantores de tango ou o que fosse. Desde 1940 se busca outro tipo de público, a uma público mais burguês, as famílias para irem ao cinema, mais amplo, com mais poder econômico. A partir de um filme de 1941, chamado “Los martes, orquídeas”, começa a capturar o público jovem e o público com dinheiro, com o qual o cinema argentino cresceu muito. A medida que o tempo passou, o público foi se aproximando cada vez mais do cinema argentino, mas o cinema argentino teve dois problemas, a partir de 1945/46: primeiro porque começou a adaptar obras literárias estranjeiras, com a finalidade de ter um público mais culto, em lugar de ter um público com mais dinheiro e segundo porque começou a haver censura. Com isso, se começou a perder muito público, durante o governo peronista, e entre os anos de 1950 e 1953 os estúdios começam a desaparecer porque o público não ia ao cinema. Se estreavam quase 50 filmes e quase ninguém ia ver. Com o aparecimento da lei do cinema, em 1957, se buscou reconstruir a indústria e a partir da década de 60, começa a haver um público que vai ver o cinema argentino, onde os poucos produtores que restam da época anterior começam a tomar as figuras populares da televisão e com isso retomam público. Os filmes da Geração de 60 tiveram pouco público, mas o necessário, constituindo um novo tipo de público, que queria um cinema mais cultivado, menos popular. Esses diretores conseguiram constituir um público que não era excessivo, mas era um público que ia para discutir estes filmes. O Grupo dos 5 não teve público, foi um capricho. O Cine de la Disgreción começou a ter um certo público, com alguns filmes que tiveram um sucesso descomunal, como “La Patagônia rebelde”, “La tregua”, “Juan Moreira”. Com o surgimento da ditadura, em 1976, o público caiu de novo, mas o cinema da democracia trouxe de novo as pessoas a rua e haviam multidões que voltaram a ver cinema argentino, porque o cinema transmitia muito o que as pessoas haviam passado na ditadura, como o exílio, a vida cotidiana diante do medo.

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Thursday, December 28, 2006

ENTREVISTA: CLAUDIO ESPAÑA
PARTE 1

Claudio España é uma referência em termos de crítica cinematográfica na Argentina e história do cinema na América Latina, não somente pelos seus mais de 40 anos a serviço da profissão de crítico e historiador, como também pelo seu papel de formador de novos profissionais, ao ser professor na Universidad del Cine (FUC) e na Universidad de Buenos Aires (UBA). Em 1994, España também publicou um livro fundamental para o entendimento da história do cinema argentino, onde retrata o período de 1983, ano de retomada da democracia no país, até o ano de 1993. Anos mais tarde, lançou quatro volumes que registram a atividade cinematográfica argentina desde 1933, ano em que surge a sonorização dos filmes na Argentina, até 1983.
Nesta entrevista concedida ao LA ARGENTINIDAD NO CINEMA, España fala sobre o processo de realização deste trabalho, assim como aspectos que marcaram o cinema argentino ao longo do século XX.

QUANDO E COMO VOCÊ DECIDIU SEGUIR A CARREIRA DE CRÍTICO DE CINEMA?
Desde a minha infância, nunca se desviou a minha atenção pelo cinema. Aos 16 anos, escrevi uma crítica sobre o filme “Gilda”, com Rita Haitworth e a levei ao dono de um jornal, na cidade de Luján, província de Buenos Aires, e ele me disse para deixar com ele. O jornal se publicava aos sábados e quando abri o jornal, lá estava a crítica do filme. Minha mãe me disse “trata de agradecer porque o senhor publicou o teu trabalho” e quando fui agradecer este senhor me perguntou quando eu traria a próxima crítica, ou seja, comecei a escrever crítica aos 16 anos. Segui escrevendo durante muitos anos, numa época que ainda não existia cursos de cinema, e fiz o curso de letras, na Universidad de Buenos Aires. Mas eu seguia escrevendo sobre cinema, tudo que aprendi no campo das letras me servia para o cinema. Eu te digo uma coisa, o curso de letras é o que mais tem a ver com o curso de cinema, sendo que a maioria dos críticos de cinema, mundo afora, cursaram letras, porque o curso de cinema pode formar diretores ou o que seja, ensinando técnicas, mas é muito difícil formar um crítico de cinema. A mim me perguntram muitas vezes na minha carreira de crítico se eu gostava de cinema, na época em que estive nas revistas Panorama, Opinión e depois no La Nación onde estive 25 anos, porque se você escreve sobre. Eu dizia que gostava duas vezes, porque gosto de cinema como qualquer espectador, mas ao mesmo tempo eu gosto por ver coisas escondidas dentro de um filme, que tem a ver com a forma, com a estrutura, que o público não tem o porquê de perceber e o crítico sim, por ter que explicitá-las para que as pessoas possam entender o cinema através da crítica.

TE PARECE QUE A CRÍTICA PODE DESTRUIR UM FILME, DEPENDENDO DA SUA POSIÇÃO FRENTE AO PÚBLICO LEITOR?
Eu creio que não se deve propôr nunca isso. A crítica pode destruir um filme, mas porque chega através de uma análise O que o crítico tem que fazer é uma análise, não uma destruição. Mas neste momento não há uma crítica demasiado sensível, nem uma crítica que analise exaustivamente os filmes, há uma crítica muito superficial nos diários na Argentina, uma crítica que conta o filme, elementos da produção, mas não no sentido da relação da forma com o conteúdo, que é o que deve buscar-se.

COMO SURGIU A IDÉIA DESTES CINCO VOLUMES SOBRE A HISTÓRIA DO CINEMA ARGENTINO E COMO SE DESENVOLVEU O PROJETO?
O Fundo Nacional das Artes, que é um organismo federal, me chamou em 94 para fazer um livro que comemorava os dez anos do cinema na democracia, os dez anos que seguiram desde o triunfo de Alfonsín, no ano de 1983. Este período teve uma cinematografia muito importante, valiosa, de filmes realmente de denúncia, filmes verdadeiramente politicos, que emocionavam, muito mais que as de agora. O Fundo me propos isto e eu, com toda liberdade, elegi um grupo de pessoas para trabalhar em conjunto, onde elaboramos um série de temas que cada um deveria desenvolver, com uma introdução no qual eu escrevia, sobre uma idéia que se elaborava em função dos fatos, como a temática dos filmes, as autoridades, o lado criativo, os diretores novos. Quando se entregou o livro e ele foi publicado, o livro foi muito êxitoso, as pessoas ficaram encantadas em recordar dez anos de cinema.
Eu então fiz uma contraproposta para escrever sobre a história do cinema argentino para trás, ou seja, desde que aparece o sonorização em 1933 até 1983, onde aparece a democracia. Armei um plano de trabalho, enviei ao Fundo, onde aprovaram e comecei a trabalhar duramente, durante quatro anos e meio de trabalho, para o que são os dois primeiros volumes, intitulado de “Indústria e Clasicismo”, que vai desde 1933 até 1956. Foi o período em que o cinema adquire seu formato industrial que dura muito claramente desde 33 até 1950, mas não terminando neste ano, pois persiste até 1956. Fizemos este período em dois volumes, estando organizados em função de como era o cinema na época, ou seja, no primeiro volume organizamos pelos estúdios, a partir do ano em que eram fundados, e dos filmes independentes. No segundo volume, fizemos os formatos artísticos que constituem essa época, que eram os gêneros, como o melodrama, as comédias, o policial e o cinema épico.

A HISTÓRIA DO CINEMA ARGENTINO ENTÃO PODE SER CONHECIDO ATRAVÉS DOS SEUS GÊNEROS?
Por isso se chama indústria e classicismo, porque o classicismo está destinado a estabelecer o formato de gêneros, porque as empresas diziam “vamos fazer tal quantidade de melodramas, tal quantidade de comédias”, ordenavam dessa manera o sistema, ou seja, nós ordenamos o livro de acordo com o que se produzia nessa época.

QUANTO AO PERÍODO RELATIVO A 1957 ATÉ 1983, COMO FOI O PROCESSO DE REALIZAÇÃO DO LIVRO SOBRE ESTA ÉPOCA?
Começamos a trabalhar, em 2002, com a parte intermediária, que corresponde de 1957 a 1983. Elaboramos esta fase também em dois volumes, pois é um período muito mais complexo. Os últimos dois volumes se chamam “Modernidad y Vanguardias” e se refere a todas as transformações que houveram no cine argentino a partir de 1960, onde não houve gêneros e não houve indústria, no sentido de que tudo eram produções independentes, ou casos como de um mesmo diretor fazer cinco filmes para cinco produtores, isso ia mudando de alguma maneira. Trabalhamos a partir dos antecedentes da modernidade, a modernidade em si, que está dividida pelo que se chamou da geração de 60, o Grupo dos 5, o cinema militante, ou seja, trabalhamos até chegar o ano de 1983, com todos os movimentos que compreendem este período. Também trabalhamos a outra metade do cinema argentino desta época, que era genérico, seguia com musicais, só que com o tango sendo mudado pelos ritmos modernos.

HOUVERAM FILMES, FATOS OU DIRETORES QUE FORAM CHAVES PARA A MUDANÇA DE UMA FASE A OUTRA DA HISTÓRIA DO CINEMA ARGENTINO?
A promulgação em 1957 da lei do cinema, traz uma novidade muito grande, que é o Fundo de Fomento, onde todo espectador que vai ao cinema, ver a qualquer filme, de qualquer origem, paga 10% de entrada para a realização de outros filmes. A aparição da lei do cinema coincide com o fim do governo peronista, que foi de 1945 a 1955 e que teve muito que ver com a caída dos estúdios e o fim do sistema clássico, porque houve muita censura e se dava dinheiro a alguns e a outros não. A nova lei estabece todo o contrário, todo a favor do cinema, inclusive com a fundação do INCAA, em 1958. Esta lei cria um sistema de créditos e subsidios, onde estabelece um sistema que se consegue dinheiro para iniciar o filme, no qual tem que devolver com um interesse pequeno e ao mesmo tempo que sobra de tudo que foi arrecadado com os 10%, se reparte entre aqueles produtores que tiveram maior parte de público. Isso era uma incongruência, porque se alguns filmes tiveram muito público, ganharam muito dinheiro e em cima de um subsidio, a lei premia a indústria que move muito público, além de ganhar muito dinheiro.
No entanto, a lei de cinema que dá dinheiro aos filmes êxitosos, também dá dinheiro aos produtores jovens que não possuem recursos. Filmando em preto e branco, a partir de 1960, já se nota que há um tipo de cinema diferente, com filmes como “Los inundados”, de Fernando Birri; “Tres veces Ana”, de David José Kohon; “Los jóvenes viejos” de Rodolfo Kuhn, e tantas outros filmes que advertem que há uma nova geração de diretores que trás uma novidade muito importante ao cinema.

Friday, December 22, 2006

ENTREVISTA: RODRIGO MORENO
PARTE 2

"El Custodio" foi um dos filmes argentinos mais êxitosos do ano de 2006. O filme ganhou 22 prêmios ao longo do ano, obteve 60 mil espectadores na Argentina (considerado bom para um filme com uma proposta mais autoral), além de boa recepção da crítica. Ao mostrar a rotina de um segurança de um ministro, "El custodio" possui um trabalho cuidadoso desde o roteiro, passando pela "puesta en escena", fotografia e montagem. Abaixo, o diretor Rodrigo Moreno fala sobre a realização do filme.

COMO FOI PARA VOCÊ O DESAFIO DE REALIZAR “EL CUSTODIO”, POIS ESTE FOI O SEU PRIMEIRO LONGA REALIZANDO INDIVIDUALMENTE O ROTEIRO E A DIREÇÃO?
- O processo é que eu conheci alguns custodios (seguranças) e o primeiro que me chamou a atenção é como essa gente que tem que estar aí por uma questão de protocolo, já que ninguém quer matar a um ministro, tem que viver através de outro, tem que estar dependendo 24 horas através de uma outra pessoa. Isso me parecia como uma boa metáfora. Me pareceu interessante também que eles não podem falar, ou seja, com todo esse silêncio, somado com toda essa dependência, me pareceu uma “cozinha” muito interessante para fazer um filme. Escrevi dez páginas, apresentei a uma oficina, que se faz em Colón, Entre Rios, onde participam projetos de Argentina, Uruguai, Brasil, Chile e México e trabalhamos durante uma semana com tutores. A partir daí, conheci uma das tutoras que foi a diretora e roteirista mexicana Maria Novaro, e ela me abriu a cabeça. Ao ler aquelas dez páginas, ela me disse “a chave do teu filme é o ponto de vista”. Não me disse isso como imposição, sim como o que deduzia daquelas dez páginas, sem que eu tivesse me dado conta, e a partir daí me esclareceu todo o filme, me deu a chave. A partir daí entendi tudo.

QUANTO A ESTAS DEZ PRIMEIRAS PÁGINAS QUE VOCÊ ESCREVEU, ELAS FORAM ESCRITAS A PARTIR DE INVESTIGAÇÕES QUE VOCÊ FEZ, OU A PARTIR DO QUE VOCÊ IMAGINAVA QUE FOSSE A VIDA DE UM CUSTODIO (segurança)?
- Fiz sobre o que eu pensava, depois escrevi uma versao do roteiro, depois outra versao e depois voltei a Buenos Aires. Com a minha camera de video, estive durante dois dias seguindo custodios, que depois geraram material para um documentário de 10 minutos que está no DVD. Nesta altura também já havia me associado a um produtor e com este documentário e o roteiro, saímos a buscar dinheiro. Para mim filmar custodios com a camera de video não foi tanto em termos de investigação, e sim em termos de eu encontrar meu próprio olhar sobre isso, como eu me deparo frente a estas pessoas que seguem um ministro real, todo dia. Me pareceu muito claro, e se você tiver a oportunidade de olhar este dvd, você perceberá que há vários planos iguais aos do filme.

ESSE DOCUMENTÁRIO ENTÃO FOI UM REFORÇO DO QUE VOCÊ PENSAVA, MAIS DO QUE UMA MUDANÇA DE ABORDAGEM?
- Depois deste documentario também surgiram idéias. A essência do filme já estava nestas 10 páginas que eu escrevi em 2002 e que são iguais ao filme.

QUANTO TEMPO SE PASSOU DESDE AS DEZ PRIMEIRAS PÁGINAS DO ROTEIRO ATÉ A ESTRÉIA DO FILME?
- Quatro anos. De rodagem foram sete semanas, de pós produção entre 12 a 15 semanas.

TE PERGUNTO COMO FOI O TRABALHO DA “PUESTA EN ESCENA” COM JÚLIO CHAVES, POIS O FILME POSSUI A BUSCA POR UMA INTERPRETAÇÃO MINIMALISTA E ATÉ QUE PONTO A ESCOLHA DE JULIO CHAVES PARA FAZER O PROTAGONISTA FOI PREPONDERANTE?
- Fazia muito tempo que eu pensava em Júlio. Primeiro eu havia pensado em fazer com um custodio real, mas quando conheci aos custodios, me dei conta que não, que eram tipos muito duros, que trabalham todo dia, não havia forma de fazer o filme com eles. Depois o filme começou a tomar outro caminho, de ficção e automaticamente eu havia pensado em um ator como Júlio. A respeito do minimalismo, me parece que esse tom já se deducia desde o roteiro. Eu havia delimitado o território e todos que entravam no filme já sabiam que era esse o território. Além do mais lidei com atores muito inteligentes, com a combinação de atores não-atores também.

QUANTO AO USO DOS ESPAÇOS, NO QUAL SE DESTACA MUITO A QUESTÃO DOS CORREDORES, POR EXEMPLO. COMO FOI A ELABORAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO DO FILME? JÁ ERA ALGO PRÉ DEFINIDO ANTES DA RODAGEM OU SE CRIARAM LOCAÇÕES DURANTE A RODAGEM?
- Foi uma combinação, há coisas que se prevê e há coisas que se encontram durante as filmagens. A mim o que me interessava é que o custodio sempre está em lugares pouco trancendentes, sempre atrás da porta, em lugares de transição como um corredor, um elevador, lugares digamos assim que seja absurdo que alguém fique. No entanto, o custodio tem que estar aí, é a única pessoa que precisa estar aí que tem que esperar em um corredor, sendo que um corredor é feito para passar, para ir e vir. Isso também foi muito determinante para obter a psicologia do personagem e com Julio Chaves se trabalhou neste sentido.

A RESPEITO DO RITMO DO FILME, QUE POSSUI UMA TEMPORALIDADE MUITO PARTICULAR, FOI ALGO QUE JÁ ESTAVA PLANEJADO DESDE ANTES DA RODAGEM OU FOI ALGO QUE SE DELINEOU DURANTE A ETAPA DE MONTAGEM?
- Com respeito a montagem era uma das coisas que eu tinha muito claro, que em algum momento você tem que sentir, o ponto de vista tem que se adonar do espectador e este tem que padecer como o custodio, para entender essa rotina, passando por essa rotina. Me parecia interessante na “puesta en escena”, estabelecer este “tédio”. A montagem trabalhou respeitando esta idéia sem que aborrecesse. Na realidade, quem entende “El custodio”, consegue entrar na lógica do filme, pois é um filme inquieto, onde há uma ameaça que não se sabe bem quem é, mas está latente e isto é montagem puro.

O PROTAGONISTA É UM CUSTODIO DE UM MINISTRO. ATÉ QUE PONTO FOI PREPONDERANTE A ESCOLHA DO PROTAGONISTA SER UM SEGURANÇA DE UM MINISTRO E NÃO DE UM EMPRESÁRIO, POR EXEMPLO? EXISTE UM POSICIONAMENTO POLITICO DIANTE DESSA ESCOLHA?
- Sim, claro, para mim o interessante é que não seja um empresário, primeiro porque a um empresário não me interessa contar porque possui a vida resolvida e o ministro não. O ministro não sabe até que ponto está posto ali por alguém ou se decidiram chegar a esse lugar, é um personagem muito mais ambíguo, interessante. Além disso, um empresário pode sofrer um atentado, de alguém que o queira roubar, e um ministro não, ninguém quer matar a um ministro menos a este ministro, que é da segunda linha. Me parecia interessante ter o protocolo. Um empresário tem um custodio porque quer, já um ministro tem um custodio porque deve ter e essa diferença é fundamental, até a respeito da insignificância ou significância do trabalho de um custodio. O empresário escolhe ter um custodio, assim o custodio tem um sentido, o ministro tem que ter por protocolo um custodio e então o custodio se coloca em algo absurdo. Depois havia algo interessante, tendo em conta um ponto de vista da política, que é o discurso vazio, tudo o que diz o ministro ao longo do filme é nada.
De todo o modo é como minha opinião sobre a política, de gente que está aí, abúlica, sem vontade de exercer nada e o exercem de maneira arbitrária. O que eles exercem não é pelo lugar que ocupam, sim pela classe social a que pertencem.

A PARTIR DO PRÊMIO QUE VOCÊ OBTEVE COM O FILME EM BERLIM, ELE TE ABRIU MAIS PORTAS NA EUROPA? COMO FOI A RECEPÇÃO DO FILME FORA PELO MUNDO E NA ARGENTINA?
- A recepção em geral está sendo boa. O filme já ganhou 22 prêmios em todo mundo, e quando acompanho o filme, percebo que possui uma boa acolhida, boas críticas, o público se mostra interessado, sempre há questionamentos, mas em geral é positiva. O bom dos prêmios é que habilita um próximo projeto, porque neste caso, custou muito conseguir um primeiro financiamento, porque depois deste primeiro se consegue mais dinheiro, buscando fundos, bolsas, concursos e assim podemos financiar o filme, mas até este momento nos custou muito chegar. Suponho que este prêmio em Berlim, pode interessar algumas pessoas em ver meu próximo filme e isso, de algum modo, é um passo.

COMO FOI O LANÇAMENTO DE “EL CUSTODIO” NA ARGENTINA?
- Foi um lançamento muito bom, sobre o filme se falava muito, até porque para a imprensa, era o filme que havia ganhado em Berlim. O filme teve uma excelente resposta do público na primeira semana, mas curiosamente o filme foi tirado de cartaz em seis das 12 salas de estréia porque vinha “Código da Vinci”. Apesar disso o filme foi muito bem, fazendo 60 mil espectadores e para este tipo de filme na Argentina está muito bem.

E COMO FOI A RECEPÇÃO DO FILME NO BRASIL, POR ONDE ELE JÁ PASSOU?
- No Brasil participamos do Cine Ceará deste ano, onde ganhamos os prêmios de melhor filme, melhor diretor, melhor ator, prêmio da crítica e prêmio da municipalidade de Fortaleza e isso possibilitou que o filme possa estrear no Brasil, com a produtora Pandora comprando os direitos. O filme também esteve no Rio de Janeiro, numa mostra paralela e teve bom recebimento, depois esteve em São Paulo, Belo Horizonte.

VOCÊ JÁ POSSUI PROJETOS PARA O FUTURO OU AINDA ESTÁ ENVOLVIDO COM O PROCESSO DE DIVULGAÇÃO DO FILME?
- É uma combinação das duas coisas. Agora estou preparando um telefilme para a televisão pública (Canal 7), que vou filmar em duas semanas e paralelamente vou a festivais para divulgar o filme, mas já com vontade de me despedir do filme. Depois deste tele-filme, vou já pensar na próxima. Tenho algumas idéias, estou escrevendo um pouco, mas necessito terminar este tele-filme.

QUE TE PARECE O CINEMA ARGENTINO HOJE, NO QUAL MUITAS PESSOAS FALAM SOBRE UM “NUEVO CINE ARGENTINO”. PARA VOCÊ QUE É DESTA GERAÇÃO DE ADRIÁN CAETANO, PABLO TRAPERO E OUTROS, QUE SURGIRAM A PARTIR DA SEGUNDA METADE DA DÉCADA DE 90, É POSSÍVEL FAZER ESTA AFIRMAÇÃO?
- Creio que desde muito anos, por volta de dez anos, tem aparecido novas gerações que tentam mudar uma forma de representação. No entanto, não é um movimento, creio que a diversidade está fazendo a riqueza do cinema argentino. Creio que estamos passando por uma outra etapa, a etapa de passar a limpo, pois se fizeram muitos filmes, muitos novos diretores e agora se está vendo quem segue. Por outro lado estão aparecendo outras expressões, por fora das estruturas oficiais. Eu vejo vários filmes de diretores muito jovens que filmam em digital, que estão produzindo coisas muito interessantes. No ultimo BAFICI (festival de cinema independente de Buenos Aires), por exemplo, se pode ver uns 15 filmes feitos sem dinheiro oficial e para mim isto é muito importante, porque tudo está muito vivo e há muita vontade de seguir renovando. A Argentina segue passando por um momento muito incrível em termos de produção cinematográfica, pela quantidade, pela qualidade e pelo que passa a nível de festivais, pois todos os festivais mais importantes, todos tem ao menos um filme argentino e isso porque a Argentina segue produzindo cinema de autor.
Creio que o que dificulta a produção de cinema na Argentina é a questão da dsitribuição, porque se fazem muitos filmes, e muitas poucas pessoas assistem. Isso é algo que está falhando.

SERIA POR UMA OPÇÃO EM REALIZAR FILMES COM UM CUNHO MAIS PESSOAL, SEM CONCESSÕES COMERCIAIS?
- Creio que é isso, me parece que é quanto a responsabilidade dos diretores. Mas o problema, de todo modo não é esse, é relativo quanto as cadeias de exibição, pois o sistema de exibição na Argentina é um sistema nefasto, cruel, a nada lhes importa os filmes argentinos e em realidade são um problema para essa cadeias. Temos um diretor a cargo do Instituto de Cine (INCAA) que parece governar para os exibidores e não para os produtores e isso é um problema, porque há muita hipocrisia neste governo e isso se vê na política cinematografica e nas artes em geral. Hoje em dia o Instituto destina uma enormidade de dinheiro para subsidiarias das cadeias norte-americanas de exibição para que passe o cinema argentino, ou seja, há algo que está muito confuso.

Wednesday, December 20, 2006

ENTREVISTA: RODRIGO MORENO
PARTE 1

Rodrigo Moreno teve neste ano de 2006 muitos motivos para comemorar. Expoente desta nova geração do cinema argentino, Moreno conseguiu estrear o seu primeiro longa metragem realizado individualmente como diretor e roteirista (havia feito anteriormente “El descanso” em trio, no roteiro e direção), chamado “El custodio” (no Brasil vai ser titulado como “O guardião). Além de ter tido grande sucesso de crítica na Argentina, o filme ganhou o prêmio Alfred Bauer, no Festival de Berlim deste ano, ao ser considerado “o filme mais inovador artísticamente, da seção competitiva”, feito conseguido pelos argentinos também em 2004, por Lucrecia Martel, em “O pântano”, assim como o prêmio de melhor roteiro latino-americano no Festival de Sundance/NHK. Mesmo antes de estrear no circuito comercial brasileiro, o filme já possui boa recepção no Brasil, ao ser o grande vencedor do festival Cine Ceará deste ano, nas categorias de melhor roteiro, melhor direção, melhor ator e prêmio da crítica e prêmio da municipalidade de Fortaleza.

Esta entrevista, realizada pelo blog LA ARGENTINIDAD NO CINEMA, será dividida em duas partes, sendo que esta primeira busca resgatar as origens e os passos iniciais da carreira de Rodrigo Moreno. Já a segunda parte irá colocar em destaque questões relativas a produção e recepção de “El custodio”, assim como sua visao sobre o cinema argentino atual e seus próximos projetos.
Bom proveito.

VOCÊ É FILHO DOS ATORES CARLOS MORENO E ADRIANA AIZENBERG (“MUNDO GRUA”, “EL ABRAZO PARTIDO”, “A TRAVES DE TUS OJOS” E OUTROS FILMES MAIS RECENTES). ATÉ QUE PONTO ISSO INFLUIU NA SUA DECISÃO DE FAZER CINEMA E EM QUE MOMENTO VOCÊ DECIDIU SEGUIR ESTA CARREIRA?
- O mundo do cinema, do teatro, das artes em geral, resulta como algo muito familiar, porque quando você vem de uma família de atores, de artistas é algo muito natural seguir este caminho. De modo que eu sempre escrevia desde criança, meu avô era escritor, e aí convém uma série de coisas, pois sempre quis contar histórias. O meu desejo de fazer cinema, creio que foi meio inconsciente, não foi premeditado pois quando eu terminei a escola não sabia o que fazer e me inscrevi em uma escola de cinema. Creio que em um ano e meio de curso me dei conta de que era o que eu queria fazer. Fiz um curta e ele foi bem, fui a festivais e comecei a viajar, e isso me fez ver que fazer cinema era uma possibilidade real, como um horizonte.

COMO FOI REALIZAR O SEU PRIMEIRO PROJETO, O CURTA “NOSOTROS”? FOI COM O PESSOAL DA ESCOLA DE CINEMA?
- No segundo ano do curso, a faculdade estava premiando projetos e os ganhadores tinham a oportunidade de filmar em 16mm. O meu projeto acabou sendo premiado e pude fazer-lo, com meus companheiros de curso que faziam fotografia, som. Nesse grupo inclusive esteve Pablo Trapero, que fez o som, sendo que os demais que participaram seguiram fazendo cinema e fazem parte dessa renovação destes últimos anos.

É POSSÍVEL FAZER ALGUMA RELAÇÃO COM UMA PRODUÇÃO DE UM FILME EM UMA ESCOLA DE CINEMA EM RELAÇÃO A UMA PRODUÇÃO PROFISSIONAL?
- Desde que eu terminei o curta “Nosotros” e o longa “El custodio” se passaram 13 anos. Isso é muito. Quando filmei “Nosotros” não tinha nem idéia do que era cinema, não sabia nada e agora sei um pouco mais que antes. Entre um e outro há muita diferença, porque o curta tem a ver com um período, uma etapa de formação, para mim foi uma experimentação, não mais que isso. Depois o curta ganha vida e tem autonomia, indo a festivais. Semelhanças há poucas, provavelmente há algo de camera fixa.

MAS NA ATUALIDADE, MUITOS PROFISSIONAIS DESTA NOVA GERAÇÃO SURGEM ATRAVÉS DAS ESCOLAS DE CINEMA. TE PARECE QUE HOJE AS ESCOLAS DE CINEMA POSSUEM UM PAPEL FUNDAMENTAL PARA A RENOVAÇÃO DO CINEMA ARGENTINO?
- Eu creio que assim como para muitas profissões tem que estudar, para o cinema se precisa estudar muito. Existem pessoas que talvez não necessitem da disciplina escolar, mas me parece que tendo escolas de cinema creio que é quase uma obrigação para quem quer trabalhar no cinema, passar por uma formação escolar, pois é uma experiência única, é uma combinação bastante particular de teoria, de reflexão, de conhecer diferentes ofícios. Como aluno, você tem que fazer muitas coisas, porque, por exemplo, num dia você está fazendo som, noutro dia está fazendo camera, e mais que nada, o mais importante é que você conhece aos seus pares, começa a conhecer gente, porque você não se forma sozinho, se forma rodeado de gente que esta na mesma que você.
Sobre a importância das escolas para o cinema argentino, creio que 80% que houve de renovação na Argentina se deve a proliferação das escolas de cinema. Eu creio que já saiu uma geração e agora está saindo outra com tanta força que isso nunca antes havia passado e isso coincide com a aparição de novas escolas de cinema em Buenos Aires e no interior. Isso é muito valioso. A Universidad del Cine (FUC) teve um papel central nisso, porque é uma escola muito séria, contando com 1500 alunos, sendo que 50% desses alunos são latino-americanos e isso enriquece muito a formação de um cinema do futuro. Além disso, está ocorrendo uma retroalimentação, pois pessoas que estudaram na faculdade agora estão ministrando aulas.

E COMO É A SUA RELAÇÃO COM PABLO TRAPERO (DIRETOR DE “MUNDO GRUA”; “O OUTRO LADO DA LEI” (EL BONUAERENSE) E “FAMILIA RODANTE”, JÁ CONHECIDOS NO BRASIL), COM QUEM ESTUDOU NA UNIVERSIDAD DEL CINE?
- Eramos um grupo de amigos muito forte, com Salvador Roselli (roteirista de “O cachorro”), Enrique Bellande (diretor e roteirista de “Ciudad de Maria”), Andrés Tambornino e Pablo Trapero. Com Pablo perdi contato, nos vemos pouco, seguimos caminhos diferentes, mas permanece o afeto, pois passamos cinco anos de nossa vida vivendo, estudando juntos, assistindo e fazendo os mesmos filmes. A escola de cinema permite algo que a comunidade de cinema não tem, que é a “camaraderia”, seguir sendo amigo de todos, porque creio que a comunidade de cinema é muito egocêntrica. Continuo sendo amigo de muita gente que estudou comigo, porque não os vejo como diretores, e sim como amigos e companheiros.

COMO FOI A REALIZAÇÃO DO FILME “MALA EPOCA” (1998), QUE FOI O SEGUNDO LONGA METRAGEM PATROCINADO PELA UNIVERSIDAD DEL CINE, NO QUAL VOCÊ DIRIGIU UM DOS QUATRO EPISÓDIOS?
- “Mala epoca” na realidade foi uma proposta dos alunos da universidade ao reitor, onde propomos para ele fazer um filme de episódios, tendo pontos em comum. Cada um deveria escrever um projeto para um média metragem, onde cada um votava os quatro que achavam melhores, não podendo votar em si mesmo, e os quatro ganhadores iam fazer o filme.
Os quatro vencedores foram Nicolás Saad, Mariano De Rosa, Salvador Roselli e eu, no qual fiz o episódio que se chama “Compañeros”. Creio que fizemos um filme muito bonito, me parece que talvez não foi um filme muito valorizado no momento, um pouco apagada pelo sucesso de “Pizza, birra e faso” e “Mundo grua”, mas foi um dos primeiros filmes de esta renovação do cinema argentino.
O filme que fiz conta a história de um homem que trabalha com som (“sonidista”), de atos políticos que se apaixonava pela amante do “capo” do bairro. A partir daí se cria uma história de amor cruzada com uma crítica muito forte ao exercício das políticas de bairros. O ponto em comum com “El custodio” é abordar o mundo da política como cenário e ter um personagem “totalmente lateral”, embora seja também diferente de “El custodio” porque possui outro tom, com mais comédia, com alguns momentos tragicômicos.

TEU FILME SEGUINTE FOI “EL DESCANSO”, UM LONGA METRAGEM FEITO EM CONJUNTO COM ULISES ROSELL, RODRIGO MORENO Y ANDRÉS TAMBORNINO. COMO FOI A REALIZAÇÃO DESTE FILME, QUE TEVE VOCÊS TRÊS PESSOAS ASSUMINDO O ROTEIRO E A DIREÇÃO?
- “El descanso” foi uma espécie de aventura de estudantes. no sentido de que se havia Depois de estreado “La mala epoca” e antes de eu ir a Espanha, por uma bolsa de estudos, havia escrito um roteiro com Ulises (Rosell) e Andrés (Tambornino). Nós já haviamos feito dois curtas, co-dirigido, no qual um curta foi dentro da escola e um curta que formou parte de Histórias Breves 1. Esta primeira realização do Histórias Breves, que foi um filme composto por 10 curta metragens feitos por jovens de 25 anos, contou com nomes como Adrián Caetano, Lucrecia Matel, Daniel Burman, Bruno Stagnaro, Sandra Gugliotta, sendo que no nosso a montagem fez Pablo Trapero, ou seja, todo o que passou depois, desta geração, passou aí. Nosso curta foi bastante êxitoso, um curta muito divertido que se chama “Adonde y como Oliveira perdió a charla” e se saiu tão bem que ficou uma assinatura pendente de que deveríamos fazer um longa metragem.
Escrevemos um roteiro onde colocamos elementos de humor negro, aventura, bastante delirante e apresentamos a um concurso. Nos esquecemos por algum tempo disto, eu fui a Espanha e então o pessoal me chama dizendo que ganhamos o dinheiro para fazer. O dinheiro não alcançava o necessário e não podíamos conseguir mais dinheiro, e era um filme muito caro que se tinha que fazer com muito pouco dinheiro. Chamamos a vinte amigos nossos e fomos a Córdoba, durante duas semanas com uma câmera de 35mm, os atores e fizemos o filme. Creio que “El descanso” é considerado a rodagem mais divertida do cinema argentinom, mas o filme foi um fracasso econômico, perdemos muito dinheiro, foi muito mal e custou muito repor. O filme ficou bom, mas não conseguiu pegar o público e nos deprimimos. Eu, durante essa depressão, então decidi escrever “El custodio”.

Monday, December 18, 2006

DADOS FINAIS: ESTRÉIAS DE FILMES ARGENTINOS NO ANO DE 2006

Com as estréias de "Mbya, tierra en rojo", de Philip Cox e Valeria Mapelman e "Como mariposas en la luz" de Diego Yaker, nesta última quinta feira, dia 14 de dezembro (dia da semana onde ocorrem as estréias em Buenos Aires), os filmes argentinos fecharam o ano de 2006, em termos de estréias no circuito comercial. Ao todo, em 2006, estrearam 64 filmes argentinos nas salas de cinema de Buenos Aires, um a mais que no ano de 2005 (63 filmes) e dois a menos que em 2004 (66 filmes).

Entre alguns destaques estão "La mala hora", de Ruy Guerra; "Lifting de corazón", de Eliseo Subiela; "El método", Marcelo Piñeyro; "Derecho de familia", de Daniel Burman; "El custodio", de Rodrigo Moreno; "Crónica de una fuga", de Adrián Caetano; "Las manos", de Alejandro Doria; "Fuerza Aérea Sociedad Anónima", de Enrique Piñeyro; "El camino de San Diego", de Carlos Sorín; "Nacido y criado" de Pablo Trapero.

Esses dados revelam não somente a regularidade da produção de filmes argentinos que entram em cartaz anualmente, como também mostra um grande progresso em relação há dez anos, quando somente 37 filmes estrearam no ano de 1996. Confira abaixo a lista integral de estréias no circuito cinematográfico argentino no ano de 2006.

JANEIRO
* "Rodeo colorado" (2005) - de Victoria Reale
* "Mi mejor enemigo" (2004) - de Alex Bowen
* "Amando a Maradona" (2005) - de Javier Vázquez
* "Ana y los otros" (2003) - de Celina Murga

FEVEREIRO
* "La mala hora" (2004) - de Ruy Guerra
* "La demolición" (2005) - de Marcelo Mangone
* "Tapas" (2005) - de José Corbacho y Juan Cruz

MARÇO
* "Cándido López – Los campos de batalla" (2005) - de José Luis García
* "Lifting de corazón" (2005) - de Eliseo Subiela
* "El método" (2005) - de Marcelo Piñeyro
* "Derecho de familia" (2005) - de Daniel Burman
* "Nordeste" (2005) - de Juan Solanas

ABRIL
* "El custodio" (2005) - de Rodrigo Moreno
* "Si sos brujo: una historia de tango" (2005) - de Caroline Neal
* "Crónica de una fuga" (2006) - de Adrián Caetano

MAIO
* "Caseros, en la cárcel" (2005) - de Julio Raffo
* "Gelbard, historia secreta del último burgués nacional" (2006) - de María Seoane y Carlos Castro

JUNHO
* "El último confín" (2004) - de Pablo Ratto
* "Una estrella y dos cafés" (2005) - de Alberto Lecchi
* "Martín Fierro, el ave solitaria" (2006) - de Gerardo Vallejo
* "Bialet Massé, un siglo después" (2006) - de Sergio Iglesias
* "Patoruzito, la gran aventura" (2006) - de José Luis Massa

JULHO
* "Cuba plástica" (2004) - de Nicolás Batlle, Fernando Molnar y Sebastián Schindel
* "El ratón Pérez" (2006) - de Juan Pablo Buscarini
* "Bañeros III, todopoderosos" (2006) - de Rodolfo Ledo

AGOSTO
* "Samoa" (2005) - de Ernesto Baca
* "El santo del pueblo" (2005) - de Lino Pujia
* "Cavallo entre rejas" (2006) - de Shula Erenberg, Laura Imperiale y María Inés Roqué
* "Pacto de silencio" (2005) - de Carlos Echeverría
* "El boquete" (2006) - de Mariano Mucci
* "Las manos" (2006) - de Alejandro Doria
* "El exilio de San Martín" (2005) - de Alejandro Areal Vélez
* "Sofacama" (2006) - de Ulises Rosell
* "Fuerza Aérea Sociedad Anónima" (2006) - de Enrique Piñeyro

SETEMBRO
* "Judíos en el espacio" (2005) - de Gabriel Lichtmann
* "Cuatro mujeres descalzas" (2004) - de Santiago Loza
* "Que sea rock" (2006) - de Sebastián Schindel
* "A través de tus ojos" (2006) - de Rodrigo Fürth
* "El camino de San Diego" (2006) - de Carlos Sorín
* "Solos" (2006) - de José Glusman
* "Ultra-Toxic" (2005) - de Jimmy Crispin
* "Doble programa" (2005) - de Alejandro Millán Pastori
* "Agua" (2006) - de Verónica Chen
* "El regreso de Peter Cascada" (2005) - de Néstor Montalbano
* "Remake" (2006) - de Roger Gual
* "Mientras tanto" (2006) - de Diego Lerman

OUTUBRO
* "Los suicidas" (2005) - de Juan Villegas
* "La punta del diablo" (2006) - de Marcelo Paván
* "Cara de queso -mi primer ghetto-" (2006) - de Ariel Winograd
* "Yo Presidente" (2006) - de Gastón Duprat y Mariano Cohn
* "Monobloc" (2004) - de Luis Ortega
* "El último bandoneón" (2003) - de Alejandro Saderman
* "Nacido y criado" (2006) - de Pablo Trapero

NOVEMBRO
* "Caballos en la ciudad" (2004) - de Ana Gershenson
* "Lo que hay que decir" (2006) - de Pablo Nisenson
* "Hamaca paraguaya" (2006) - de Paz Encina
* "Ruido" (2004) - de Marcelo Bertalmío
* "Chile 672" (2006) - de Pablo Bardauil y Franco Verdoia
* "Chicha tu madre" (2006) - de Gianfranco Quattrini
* "Yaipota ñande igüi - Queremos nuestra tierra" (2006) - de Lorena Riposati
* "El buen destino" (2005) - de Leonor Benedetto

DEZEMBRO
* "Fusilados en Floresta" (2005) - de Diego H. Ceballos
* "Mbya, tierra en rojo" (2004) - de Philip Cox y Valeria Mapelman
* "Como mariposas en la luz" (2004) - de Diego Yaker

Friday, December 15, 2006

ENTREVISTA: SANTIAGO CARLOS OVES
PARTE 2

Nesta segunda parte da entrevista, Santiago Carlos Oves fala sobre a recepção que "Conversando com mamãe" (Conversaciones con mamá), teve no Brasil, assim como o seu desejo em realizar uma parceria com o Brasil para o seu próximo projeto, entre outras coisas.

COMO TE PARECE QUE ESTA O CINEMA ARGENTINO HOJE?
Me parece interessante e até em alguns casos, fascinante. Há exemplos do que se chama o “nuevo cine argentino” muito destacáveis e outros que não. Eu não creio muito nos nuevos cines argentinos, nuevos cines italianos… eu creio que há filmes bons e há filmes ruins. Ultimamente há filmes que são muito bons e há filmes que são muito ruins, como em todos os tempos. La transcendência que tem tido o cinema argentino nos bons filmes é importante, porque se abriu o mercado, o cinema argentino é conhecido mundo afora e é respeitado, mas isso sempre pelos bons filmes. Eu tive a oportunidade de estar com gente do exterior vendo filmes argentinos ruins do nuevo cine argentino e ficaram espantados.

UMA COISA QUE ME CHAMOU A ATENÇÃO FOI A ESTRUTURA QUE TEM BUENOS AIRES EM TERMOS DE CURSOS DE CINEMA E A SUA ACESSIBILIDADE. GOSTARIA QUE VOCÊ FALASSE, COMO PROFESSOR QUE É, SOBRE ATÉ QUE PONTO ISSO INFLUI HOJE NA APARIÇÃO DE ESTA NOVA GERAÇÃO DO CINEMA ARGENTINO?
Em termos de escolas e cursos, é realmente um país atípico, porque são 15 mil estudantes de cinema com muitas escolas de cinema. O tema é quem contém esses 15 mil estudantes quando os recebe. Escolas como o CIC (Centro de Investigación Cinematográfica) é interessante sobre como aponta os ofícios, coisa que se havia perdido no devenir histórico do cinema argentino, se perdeu os ofícios e há muita gente mais experiente que pode ensinar muitas coisas. Se pode conter estes 15 mil estudantes, se pode conter os distintos oficios, mas se todos querem ser diretores então se estaciona. Mas se alguns querem ser roteiristas, refletoristas, diretores de fotografia, de som, etc., há uma cadeia no mundo inteiro, não somente na Argentina. Se um diretor quiser fazer seu projeto, tem dificuldades de fazer-lo aqui, assim como tem na Espanha, no Brasil.

COMO PROFESSOR DE CINEMA, COMO COMEÇASTE E O QUE TE DEU VONTADE DE SEGUIR NESTA CARREIRA?
A docência me aportou muitas coisas, como por exemplo no sentido que aprendo com os alunos também, o fato de que eu seja professor de roteiro me faz que eu possa entrar no imaginário dos alunos, entrar no imaginário de uma geração, me faz compreender isso. O tema da docência, eu creio que se deve transmitir as experiências que possui, as vezes me canso, te confesso, mas é satisfatório transmitir experiências, porque transmito a eles o que a mim me passa e trato de que os alunos me transmitam o que passa a eles, porque a relação professor-aluno tem que ser democrática.

VOCÊ ESTEVE NO BRASIL NO INÍCIO DESTE ANO PARA PROMOVER O FILME “CONVERSACIONES CON MAMA”. COMO FOI A RECEPÇÃO DO FILME NO BRASIL?
Eu estive em Porto Alegre, São Paulo e Brasilia. A experiência de Porto Alegre foi fantástica, porque percebi que o público desfrutou muito o filme, isso eu percebi porque tratava de não perder as exibições. En São Paulo o filme participou de uma inauguração de quatro salas que estão ao lado da Universidade e no dia que fui, a recepção do filme foi magnífica, tanto que o filme ficou nessa sala durante quatro meses. Depois me chamaram do Rio de Janeiro, onde não cheguei a ir, mas fizeram reportagens e sei que a recepção por lá foi muito boa. Também me chamaram de Brasil porque queriam fazer uma peça de teatro baseada no filme.

VOCÊ ACREDITA QUE É NECESSÁRIO TER UM INTERCÂMBIO MAIOR NO ÂMBITO AUDIOVISUAL, EM ESPECIAL NO CINEMA, ENTRE BRASIL E ARGENTINA? COMO TE PARECE A SITUAÇÃO ATUAL?
Não tenho informação a respeito, mas o intercâmbio entre Brasil e Argentina em termos cinematográficos pode ser interessante. Para existir esse intercâmbio se tem que planejar projetos, insistir com projetos culturais. Uma vez que enganche alguns projetos, eu não vejo nenhum impedimento. Tal é assim que eu tenho um roteiro que acabam de aprovar no INCAA, que se chama “El fantasma de la noche” e que tenho intenção de fazer uma co-produção entre Brasil e Argentina, porque há dois ou três personagens que podem fazer atores brasileiros. Meu sócio tem toda a intenção porque ele fez uma co-produção entre os dois países, tempos atrás, aparando o tema do Mercosul. Estamos tentando ver se podemos conectarse com eles.

Wednesday, December 13, 2006

ENTREVISTA: SANTIAGO CARLOS OVES
PARTE 1

Santiago Carlos Oves foi uma das primeiras pessoas com quem eu tive o privilégio de conhecer no meio cinematográfico argentino. Ter a oportunidade de participar do curso de roteiro no qual ministra pelo SICA trouxe não somente perspectivas para conhecer melhor o processo de construção de um roteiro, como também sobre o sentido do cinema. Nome de referência para conhecer o cinema argentino nos últimos vinte anos, Santiago foi roteirista de filmes de êxito como “EVA PERON, QUIEN QUIERE OIR QUE OIGA” e "SOL DE OTOÑO", ambos dirigidos por Eduardo Mignona. Recentemente, dirigiu o filme "CONVERSACIONES CON MAMA", qu esteve em cartaz durante este ano no Brasil.
Abaixo, a primeira parte da entrevista que o LA ARGENTINIDAD NO CINEMA realizou com ele, no qual fala um pouco sobre a sua carreira, assim como questões relacionadas a construção de um roteiro. Nesta próxima sexta feira, LA ARGENTINIDAD NO CINEMA coloca a segunda parte no qual fala sobre o cinema argentino atual, a repercussão de seu mais recente filme "Conversaciones con mama", no Brasil e outras questões.

COMO VOCÊ COMEÇOU A FAZER CINEMA E O QUE O MOTIVOU A INGRESSAR NESSA CARREIRA?
Para minha geração, o cinema era parte da vida cotidiana, estamos falando da década de 50, quando a televisão surge na Argentina, mas sem possuir muitos canais. Digo isso para que os jovens possam compreender que naquela época não tinha a diversidade que existe hoje em dia na televisão. Quando eu tinha 20 anos ia de cinco a sete dias por semana ao cinema, no qual comecei sendo um espectador. O cinema foi se tornando uma parte importante na minha vida, com o passar dos anos, e por essas circunstâncias, fui boletero, ou seja, vendia bilhetes em um cinema que mostrava filmes como os da Nouvelle Vague, o Novo cinema alemão, Novo cinema argentino na década de 60, o que foi o neo-realismo italiano, o pós neo-realismo italiano. Eu me lembro que tinha o horário das duas da tarde até seis da tarde, porque depois vinha um outro boletero para me substituir e eu ia então a ver todos os filmes. Estava fascinado pois comecei a descobrir os artistas de cinema, como Rossellini, Godard, Truffaut. Quanto ao cinema argentino, comecei a ver filmes de Leopoldo Torre Nilsson, um dos maiores cineastas argentinos, Leonardo Favio na sua primera época, de filmes como "Crónica de un niño solo", "Éste es el romance del Aniceto y la Francisca", "El dependiente" que foi a época independente do cinema preto e branco, tão particular. Foi então que assim comecei a me apaixonar pelo cinema. Eu tinha amigos que haviam feito teatro na década de 60, nas vilas e aí comecei a conhecer pessoas vinculadas com o cinema e um dia me disseram se eu queria trabalhar no cinema como ajudante de direção. Eu disse que sim, me deram uma “pizarra”, onde eu tinha que anotar as cenas, os planos e desde essa primeira vez, se passaram 40 anos que sigo no cinema.

VOCÊ ESTREOU NA DIREÇÃO EM 1987 COM "REVANCHA DE UN AMIGO". COMO FOI DESDE ESTE PRIMEIRO TRABALHO NO CINEMA ATÉ CONSEGUIR FAZER TEU PRIMEIRO FILME?
Bem, eu fiz muitas funções, como pizarrero, depois como continuista, que isso me deu muito oficio, porque na minha época não existia o que existe hoje, que é o assistente de video. Eu tinha que tomar o roteiro e desenhar tudo quando os diretores faziam os cortes de uma cena a outra, de um plano a outro, no qual me deu uma prática muito grande en termos de visualização porque fiz quase 15 filmes como continuista, o que aqui se chama de primeiro ajudante de direção. A partir desse momento como sempre quis progredir, me chamaram para organizar a assistência de direção, organizando o plano de rodagem de cada filme. A questão é que entre uma coisa e outra, creio que fiz entre 40 a 45 filmes, desde este momento. Um dia me cansei, não queria mais fazer o trabalho de assistência e comecei com um roteiro debaixo do braço, que depois se chamou "Revancha de un amigo" e então fui a recorrer as produtoras. Meti o roteiro no Instituto (INCAA), e fui selecionado, com a condição de fazer o filme em três meses. A partir deste momento que fiz este filme, estive parado durante muito tempo, quase nove anos sem fazer cinema.

PORQUE DECIDISTE DEIXAR DE FAZER CINEMA POR NOVE ANOS?
Meu primeiro filme me decepcionou muito. Na realidade me decepcionaram os produtores e tive uma decepção tão grande, que não tinha mais vontade de filmar, até que voltaram a me chamar para fazer assistência em alguns filmes. Voltei a trabalhar com amigos como Eduardo Mignona, que me convocou novamente, que eu já havia feito um roteiro com ele (Evita (quien quiera oír que oiga)). Eu então aceitei o convite, porque essa coisa de rodagem, essa coisa da câmera, de tudo eu sentia falta realmente e então voltei com isso. A partir de voltar novamente, trabalhei em uma co-producão argentino/ norteamericana, mas disse “eu tenho que dirigir outra vez”. Então apareceu meu segundo filme, que se chamou "El verso" e desde este momento fui medianamente bem com este filme, me deu bastante satisfação e desde então a cada dois anos faço un filme.

TE PERGUNTO SOBRE TUA RELAÇÃO COM O ROTEIRO, PORQUE VOCÊ SEMPRE FEZ O ROTEIRO DOS TEUS FILMES?
A respeito do tema sobre o roteiro é muito simples, pois eu escrevo roteiros porque tenho que fazer filmes e o roteiro é o princípio de tudo. Há também a questão de que se eu quero fazer um filme, não tenho como pagar a um roteirista. Até agora tenho me saído bastante bem, mas de repente, se eu encontrar um roteiro que me satisfaça, o aceitaria, iria adiante con esse outro roteirista e trabalharia. Tive algumas experiências que ainda não conclui, como por exemplo, um velho sonho que tenho de adaptar um livro de um Rodolfo Walsh (escritor argentino desaparecido na época da ditadura militar), que é "El caso Satanovsky" (1973). Eu me dei conta que este caso me inquietava e convoquei a um amigo e roteirista que me ajudara nisso. Trabalhei em roteiros para outros como no caso de Mignona (Evita – quien quiere oír que oiga; Sol de Otoño) trabalhei para diretores como Juan Carlos Desanzo (En retirada - 1984) e José Pablo Feinmann. Sempre estou aberto.

VOCÊ TAMBÉM FEZ ROTEIROS PARA FILMES NO QUAL FORAM REALIZADOS POR OUTROS DIRETORES. BASEADO NISSO, ATÉ QUE PONTO PODE SER MAIS FÁCIL OU MAIS DIFÍCIL PARA UM DIRETOR REALIZAR UM FILME TAMBÉM COMO ROTEIRISTA OU ASSUMINDO O ROTEIRO DE OUTRA PESSOA?
Ao ter o roteiro de si mesmo, você tem que converterse em uma outra pessoa, é uma tarefa quase esquizofrenica porque em geral se tem uma tendência em se enamorar com o roteiro e então buscar tempo para que isso amadureça. Quando termina esse tempo, você deveria se encontrar consigo mesmo e perguntar o porquê de ter escrito este roteiro. A vantagem de trabalhar com o roteiro de uma outra pessoa é que o diretor perde questão da subjetividade do roteiro e começa a encontrar a subjetividade da puesta en escena.

VOCÊ FEZ O ROTEIRO DE “EVA PERON, QUIEN QUIERE OIR QUE OIGA” QUE É UM DOCUMENTÁRIO, ASSIM COMO TANTOS OUTROS ROTEIROS PARA FICÇÃO. QUAL É A DIFERENÇA ESSENCIAL ENTRE UM E OUTRO?
O roteiro de um documentário sempre começa com um pré-roteiro, não é um roteiro. O pré-roteiro aponta a ordenar a imagem ou os entrevistados, aponta a algo, mas que é provisório. Uma vez que está todo filmado então se planeja um roteiro para ir a sala de montagem e elaborar o filme. Na ficção é totalmente diferente, pois no roteiro já se planeja posturas dos personagens, conta o relato, aponta em vez de um princípio, um fim, onde estão os diálogos, as descrições dos personagens, as descrições das locações.

QUAIS SÃO OS ELEMENTOS ESSENCIAIS PARA FAZER UM BOM ROTEIRO?
É uma pergunta muito difícil. Antes de tudo é ter uma boa história para fazer um roteiro. Uma boa história não garante um bom roteiro, mas é um bom ponto de partida. Ter personagens interessantes, quando digo isso é ter personagens de tal complexidade que o espectador se sinta atraído pelo mistério, pela complexidade dos personagens, que sinta as vezes identificação com estes personagens. Encontrar um como desta história, ou seja, encontrar um relato suficientemente atrativo para que essa historia siga na sua totalidade, na sua originalidade, que seja entretenida.

Monday, December 11, 2006

TRINTA ANOS SEM ENRIQUE JUÁREZ

No dia 10 de dezembro de 1976, Enrique Juárez, militante e cineasta, participante do grupo de "Cine Liberación" e membro da organização Montoneros, desapareceu e até então não foi mais encontrado, vítima da ditadura militar argentina que ressurgia neste mesmo ano.

Juárez, nascido no dia 12 de outubro de 1944, conseguiu realizar somente dois filmes: "Argentina, mayo de 1969: los caminos de la liberación" e o média metragem "Ya es tiempo de violencia", ambos de 1969 (no qual, além da direção, assumiu a função de roteirista, produtor e montador). Seu trabalho é referência para entender este período de transformações na Argentina e América Latina, com o ressurgimento da repressão militar

Para assistir a "Ya es tiempo de violencia", se pode acessar o site da "Ágora TV".
O endereço é: http://www.revolutionvideo.org/agoratv/secciones/memoria/ya_es_tiempo.html

Saturday, December 09, 2006

Começa hoje a Terceira Edição do Pantalla Pinamar

Ocorre de hoje até o dia l6 de dezembro o Pantalla Pinamar 2006-2007, em Pinamar, balneário localizado na costa atlântica argentina. Classificado como Encuentro Cinematográfico Argentino-Europeo, este evento é organizado pelo Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales (INCAA), através de sua Consultoría de Festivales y Relaciones com Europa, e pela Intendencia Municipal de Pinamar, através da Secretaría de Turismo e Cultura da cidade de Pinamar.

O Pantalla Pinamar é destinado a promover conjuntamente a produção argentina e européia, sendo o único evento que adota esta modalidade na Argentina. Para este ano a programação conta com 51 filmes, incluindo um programa especial de curta metragens. Entre as mostras se destaca a “…Y el ganador es”, onde serão exibidos filmes argentinos que ganharam prêmios em festivais locais como Balance de Oro, Festival de Mar del Plata, e de Bronce, além do Premio Signis, reservado a filmes argentinos que concorreram ou ganharam alguma distinção em festivais internacionais de Classe A, ao longo deste ano de 2006.

Haverá também a mostra “Hoy es mañana”, no qual se realizam pré-estréias de filmes que estrearão em circuito no ano que vem, como La mejor juventud, filme do italiano Marco Tulio Giordana (passado no Festival de São Paulo em 2005);
Paris, je t´aime, realizado por vários realizadores sobre a capital francesa; Tiempo de vivir, de François Ozon, entre outros. Nessa edição se incluem a mostra “Y nada más que la verdad” dedicado a documentários, além das mostras “Un día, un film”, em que passarão filmes ainda sem distribuição comercial assegurada e “Lo mejor del Festival de Málaga” com filmes que tiveram destaque no certamen da cidade espanhola.

Todos os filmes argentinos participantes terão delegações presentes no balneário, além da presença de autoridades, diretores, produtores e atores de algumas produções européias. O festival realizará também o sorteio de uma viagem para duas pessoas (incluindo pasagens aéreas, hotel e comidas) para assistir, como convidados especiais, a próxima edição do Festival de Málaga, que ocorre de 9 a 17 de março de 2007.

Para maiores informações, acessar o site: www.pantallapinamar.com/20062007.html

Monday, December 04, 2006

(foto: Crónica de una fuga)

Filmes de Burman e Caetano, concorrem ao Globo de Ouro 2007

Os filmes Crónica de una fuga, de Adrián Caetano e Derecho de familia, de Daniel Burman foram pré-selecionados para a disputa a ediçao de 2007 do Globo de Ouro. Ambos estao entre os 56 filmes que tentarao concorrer pelo prêmio de melhor filme estrangeiro, outorgada pela Asociaçao de Imprensa Extranjeira de Hollywood. A lista com a eleiçao dos cinco finalistas para o evento será divulgada no dia 15 de janeiro de 2007.

A diferença dos prêmios Oscar — onde cada país elege um representante—, para o Globo de Ouro, a Associaçao pré-seleciona a partir dos filmes que apresentam os produtores. A lista dos 56 filmesa ainda inclue nomes como Volver, de Pedro Almodóvar; Black Book, de Paul Verhoeven; Curse of the Golden Flower e Riding Alone for Thousands of Miles, ambas de Zhang Yimou; Nuovomondo, de Emmanuele Crealese; El laberinto del fauno, de Guillermo del Toro; Angel-A, de Luc Besson; Offside, de Jafar Panahi; El caimán, de Nanni Moretti, entre outros.

Além desta nomeaçao, Crónica de una fuga foi eleito como um dos cinco candidatos ao mesmo prêmio para o Independent Spirit Awards, chamado de Oscar do cinema independente. Já Derecho de familia está pré-selecionado para concorrer ao Oscar como melhor filme estrangeiro.

Sunday, December 03, 2006

COMENTARIO
Festival Internacional de las Escuelas de Cine

Há questão de poucos anos, os cursos de cinema no Brasil aumentaram, dando adeus aquela época onde se tinha que ir para São Paulo, Brasília, ou Rio de Janeiro para conseguir uma formação acadêmica, ou fazer cursos de comunicação afins a área de cinema, como jornalismo e publicidade. Se levarmos em conta Porto Alegre, suas primeiras turmas dos cursos de cinema da PUCRS/FAMECOS e da UNISINOS já estão se formando e o mercado cinematográfico em si começará a possuir uma especialização maior, com profissionais que estudaram de dois a três anos com o objetivo de fazer e produzir cinema.

Diante dessa situação, creio que as instituições que possuem estes cursos também necessitam chegar a um outro estágio: o de produzir um festival das escolas de cinema, seja em nível regional, nacional, e/ou internacional. Afirmo isso diante da posição de espectador que fui desta 7ª edição do Festival Internacional de Escuelas de Cine, realizado pela Universidad del Cine, em Buenos Aires.

O que se viu no festival foi uma busca pelo intercâmbio de idéias, de formações práticas entre os mais diversos trabalhos feitos em cursos de cinema e uma possibilidade de conhecer, acima de tudo, algo que está começando a florecer, futuros profissionais em seus primeiros filmes. Muitos destes alunos podem até não seguir diretamente no cinema com o tempo, mas ali, nestes trabalhos de faculdade, está registrado a concretização de um projeto com meses de trabalho e muitas pessoas envolvidas, em um âmbito que ainda não se discute questões mercadológicas e sim propostas estéticas. Somente para citar alguns destes nomes que surgiram nas faculdades, Lucrecia Martel, Pablo Trapero, François Ozon e tantos outros.

Por isso, um festival de escolas de cinema no Brasil se faz urgente para que a exibição destes trabalhos não fique restrito somente ao âmbito dos professores, familiares e estudante de determinada faculdade. Com uma seleção de grande nível técnico, mas sobretudo com trabalhos possuindo a preocupação narrativa e estética em contar uma história, este festival não ficou devendo em nada aos demais festivais a nível competitivo.

Vale destacar também a presença do público, que durante os cinco dias de exibição da mostra competitiva lotou a sala de projeção da Universidad del Cine, com capacidade para aproximadamente 100 pessoas. As demais mostras paralelas obtiveram um bom público, assim como as master classes de Dudley Andrew. Realizar um festival de escolas de cine é a oportunidade de deixar acontecer o intercâmbio entre estudantes de diferentes faculdades e de diferentes localidades, inclusive. Quem ganha com isso são os alunos, as instituições e o espectador que vai em busca de novas propostas e questionamentos.